domingo, 18 de março de 2012

Entrevista com Prof. Gilson Rocha de Oliveira

Bem, hoje teremos uma postagem que iniciaria nosso projeto de entrevista com autores, jogadores, ilustradores e outros mais, relacionados com o RPG, e nosso primeiro entrevistado foi: Professor Gilson Rocha de Oliveira, que participou recentemente do concurso da Secular Games, com a Ideia, Deuses Guerreiros. Confira a Entrevista!



1. Analisando o seu projeto, que definiu como "Ideia", para o concurso da Secular Games, você faz menção as divindades que recebem os aspectos de inúmeras divindades, dando a opção dos jogadores descobrirem sua jornada. O que levou a essa ideia para o projeto?



R: Acho que a pergunta é “menção as pessoas que recebem os aspectos de inúmeras divindades”. Há alguns anos, vi um amigo jogando God of War. Já conhecia o jogo de reportagens e alguns trailres, mas até então nunca tinha visto, não tenho videogame há quase duas décadas (mas gosto de alguns jogos para computador, como os de estratégia RTSs).

Abstraindo que era um jogo, imaginei um mortal pleiteando ascender à condição de deus. Mesmo que ele fosse metade filho de algum deus ou deusa, imaginei que seria “politicamente” e/ou “divinamente” impossível.

No jogo ele não ficava “ferido” com os danos que recebia, como a grande maioria dos jogos eletrônicos, se não todos. Claro, ele deveria ter algo divino nele! Então dias depois me lembrei do RPG O Desafio dos Bandeirantes que tenho e de uns postais sobre os orixás que comprei numa viagem à Salvador, Bahia. Para quem não conhece, este RPG trata de um Brasil colonial fictício com nossas lendas vivas, tribos de índios alados e magias provenientes das culturas europeia, indígena e africana. Então imaginei o roteiro para um RPG de pessoas recebendo as divindades africanas, depois ampliei para todas as divindades do planeta, suas variações e inimigos. Requer muita pesquisa.


2.Ainda nessa questão do projeto, achamos curioso apenas uma página para concorrer, dentre os vários outros que possuem em geral mais de 20 páginas. Qual é sua expectativa, em relação a concorrer com um projeto de apenas uma página?

R: Não pretendo ganhar, só aproveitei para enviar esta ideia de alguns anos para o concurso. Como disse e você lembrou, é apenas uma ideia mesmo. Estou na reta final de meu mestrado (sobre RPG e educação, aguardem) e para quem está fazendo ou já fez TCC ou outro trabalho de conclusão de curso, conhece bem os perrengues que acontecem. Então não pude fazer o jogo propriamente dito, com regras e maiores detalhes. As diretrizes do concurso ajudaram a moldar a linha central da narrativa do jogo.




3. De modo geral, temos várias boas ideias inscritas no concurso, das mais variadas formas. Do seu ponto de vista, como analisaria a proposta do concurso?


R: Fomenta o mercado e isto é sensacional. Nós jogadores que sempre sonhamos em publicar algo, sabemos que isto é possível, vide o Terra Devastada, Abismo Infinito, Violentina, +2d6 e outros que posso esquecer. Todos estes são iniciativas de jogadores que tiveram uma boa ideia e conseguiram alcançar a publicação.



Em meu blog (rpg simples) discuto RPG e educação e criação de jogos, algo que me intriga indiretamente desde 1994 e diretamente desde 1999. Vemos que os criadores não precisam reinventar a roda por uma mecânica, mas sim usar/criar um sistema que caiba como uma luva para sua ideia. Em tempo, eu defino mecânica como serão feitas as jogadas (dado melhor para mais, para menos, com cartas, dominós, etc.) e o sistema como isso faz as coisas acontecerem.





4. De um ponto de vista geral do RPG, você já está a um bom tempo nessa área.  Como analisaria a evolução do RPG, da época que começou a jogar para os dias atuais?


R: Menos regras! Para mim esta é a evolução. Acredito que por conta de processos culturais, tenho a impressão que o jogador brasileiro de RPG, em geral, não gosta de jogos tão detalhados. É uma hipótese, não tenho uma pesquisa para fomentar isto. Os estadunidenses jogam jogos de miniaturas e transportar isto para o RPG deve ter sido tranquilo. E qual foi minha surpresa ao ouvir o Chris Pramas em Curitiba, estadunidense autor do Dragon Age, dizer que quando ele era jogador acreditava que o melhor eram mais regras detalhadas, e como desenvolvedor ele aposta em poucas regras, vide o próprio Dragon Age se comparado às últimas edições do Dungeons & Dragons.

E chamo de revolução a questão da narrativa compartilhada, mas não tenho muito a comentar sobre esta vertente, pois o mestrado ainda não me deixou experimentar adequadamente.




5. Em seu blog, vimos que está engajado em uma pesquisa que trata de usar o RPG na formação de professores em universidades públicas. Sendo assim, o que poderia dizer em relação ao RPG e as formas de educação.


R: Bem, na verdade minha pesquisa analisa os discursos de sujeitos que são ao mesmo tempo docentes e mestres de RPG, exercem duas práticas narrativas, a docência e a mestragem do RPG. Eles são professores em diversos tipos de instituição, pública, privada, educação básica e superior.

Há algumas pesquisas de mestrado e uma de doutorado que discutem especificamente a educabilidade do RPG, de como ele pode ajudar no aprendizado em geral ou de uma disciplina específica. Algumas pesquisas mostram que isto realmente acontece, mas que não é uma metodologia que salvará a educação e nem todos os jogadores de RPG, mesmo os mestres, se beneficiam de sua educabilidade.

Se o RPG tem mesmo todo este efeito, é de estranheza ver (ou ler) tantos jogadores e mestres que escrevem muito mal (vide a Internet) e falam errado, principalmente na conjugação dos tempos verbais. Em Belém onde moro, Estado do Pará, geralmente tratamos as pessoas na segunda pessoa do singular (tu), à vezes usamos a terceira através do “você” e é de dar pena ouvir jogadores e mestres de RPG falando tão errado. E são pessoas que estão na escola ou na universidade. É muito pior para mestres, pois estes supostamente lêem mais e escrevem mais que os jogadores. “Tu pegasse” ou invés de “tu pegaste”.

Se eu escrevo corretamente foi por causa do RPG. Só uma curiosidade: as seleções de mestrado em educação são, geralmente, compostas de uma redação e muitos candidatos, a maioria professores e professoras, não passam nem da redação, não sabem escrever (coerência, coesão). Não passei da primeira vez que fiz a seleção, pois eu não dominava o conteúdo, então eu li os livros indicados para a redação e passei em duas seleções, na universidade estadual e na federal, onde fiquei. E minha formação inicial é em propaganda, não em áreas de educação. O mestrado me permitirá lecionar em cursos de graduação.





6.O RPG é desconhecido e discriminado por grande parte da população, que o vê como formas de manifestações "demoníacas" muita das vezes. Isso faz com que muitos pais proíbam os filhos de comprometer-se com essa diversão. De um ponto de vista geral, como você analisaria essa questão?


R: Um processo histórico causado por uma parcela irresponsável pela imprensa. É possível reverter isto, mas vai demorar. São pais que provavelmente não se interessam pelas atividades dos filhos, pois se fosse de seu real interesse, parariam para ler e tentar entender o que realmente é o jogo.




7. Ainda vendo essa discriminação pela população, do RPG, existiria alguma forma dos praticantes do jogo mudarem essa visão de preconceito?


R: Uma boa saída para que tem este problema com os pais é oferecendo um RPG pequeno para eles lerem e convidar para ver o jogo. Em meu blog é possível baixar o RPG BÁSICO que explica detalhadamente o que é RPG e fala um pouco de RPG e educação. São apenas 10 páginas. E eles podem mostrar a lista de trabalhos científicos com RPG e educação.





8. Falando de aprendizado lúdico: como você acha que o RPG poderia ser usado na sala de aula, como forma de contribuir na formação de alunos?


R: A pesquisa de Matheus Vieira trata especificamente disto e sugiro a todos lerem. E há outras pesquisas também, todas interessantes.

Acredito que o RPG pode ajudar, mas não é a metodologia milagrosa que salvará a educação. E sobre ludicidade na educação, há dezenas ou centenas de pesquisas.

Tenho pensado em avançar neste assunto como pesquisa de um possível doutorado, mas só em alguns anos e talvez.


Espero ter contribuído com esta entrevista e agradeço a todos do blog.



Prof. Gilson Rocha de Oliveira

7 comentários:

  1. \o/

    Este ai é um dos meus!
    Faço licenciatura em artes visuais e amo o RPG, sendo mestre de um dos livros da Daemon chamado Londres 2053. Também acredito que o RPG pode ajudar na educação. ^^

    ResponderExcluir
  2. Que bom, Frigga. Há um mestrado sobre RPG e comunicação, sobre a questão das imagens. E um doutorado da mesma autora, sobre a criação visual de um RPG.

    Gilson

    ResponderExcluir
  3. Godinho. Aqui tem mais, porém ainda não pude parar para disponibilizar tudo, que se encontra espalhado por sites pessoais e das instituições.

    http://rpgsimples.blogspot.com/2010/07/bibliografia-rpg-e-educacao.html

    Gilson

    ResponderExcluir
  4. Será que existe alguma forma entre relacionar a Engenharia com o RPG? Isso seria sonhar de mais, eu acho.

    ResponderExcluir
  5. Fernando, depende da linha do programa de pós-graduação. Se for Civil e for uma linha com história das construções, sei lá, você poderia relacionar aos prédios que aparecem em alguns livros. Se for Mecânica, poderia algo sobre vaporpunk, como em Reinos de Ferro.

    Saindo um pouco de RPG fantástico, tem essa ponte das obras medievais em RPGs com esta temática, como Mini Gurps As Cruzadas.

    Gilson

    ResponderExcluir
  6. Também lembrei do suplemento Mapas da Terra-média: Cidades e Fortalezas. Ótimo para algo com engenharia civil.

    Gilson

    ResponderExcluir